Prisioneira de Ayres
Os olhos se abriram vagarosamente. O Senhor havia chegado. Ele tinha os olhos e barba brancos. Os seus cabelos eram alvos, muito claros e reluzentes. Sua longa barba reluzia ao branco flamejante da saleta.
A Prisioneira era tão bela que poderia seduzir qualquer homem da esfera terrestre. Era a própria Afrodite, mas ainda mais graciosa e majestosa.
— Senhor de Ayres, lhe agradeço pela preocupação, mas é mister sentir remorso... Sabe, meu senhor, eu sinto que estou casta, tal como nunca estive — dissera a Prisioneira sussurrando com uma voz suave e melodiosa (sempre sussurrava docemente, era calma e austera ao expressar-se).
O Senhor pôs-se mais a frente vagarosamente e articulara:
— Sim, minha senhora, sinto que estás casta. Porém que habitares Ayres como prisioneira pelo pecado que te carregas desde o nascimento. Prometa-me que não mais perturbarás o sonho de outro mortal — este tem a voz grave e bela, como a voz de um vigoroso homem.
— Não alcanço o privilégio interior. Sei que preciso esquecer do mundo exterior; todavia se torna algo impossível quando eu vou me tornando mulher. Percebes-te, Laion?
— Sei de todas as coisas que cogitas, Princesa de Ayres; entretanto deves tentar ocultar esses desejos... — pausa — senão algo do pior acontecerá.
—... Mas o meu amor está a minha espera — lágrimas. — Não posso continuar prisioneira. Este cubículo, sei, foi a melhor coisa que encontraste. Aqui estou presa desde o meu surgimento; pois completo hoje meus quinze anos, Laion, senhor.
— Desculpe-me, princesa — cerrou os olhos, comovido —, não mais posso ajudar-te.
Retirou-se pausadamente da alcova, que era um quarto claro e brilhante como a estrela da noite, era inteiramente compacto, e eternamente cerrado.
A Prisioneira acomodou-se sobre o chão e pôs-se a chorar. O seu pranto perdurou algumas horas.
— Por que choras, princesa? — questionara uma voz que surgira abruptamente na alcova.
— Não mais posso vê-lo... Esqueça-me! — segredara a Prisioneira.
A imagem do cavalheiro se fez. E ela abraçava a senhorita com ternura, sussurrando-lhe aos ouvidos coisas amáveis e esplêndidas. Entoara uma canção de rimas e ecos rígidos, que seguiam. E a princesa secou as lágrimas, abraçando o cavalheiro. Ali estavam em meio a uma floresta apaixonante, dedicando reciprocamente a afabilidade de seus corpos ardentes.
Entretanto, logo o jovem despertara de suas quimeras e sentira a ausência do calor do corpo da senhorita.
Na sua prisão chegara o rei de Ayres, seu pai. Uma cólera o tomava:
— Serás castigada, princesa! Como ousas enfrentar as minhas imposições? Ficarás aqui para toda a eternidade e não mais verás ninguém, e as suas visões e poderes serão aniquilados. E tu sabes que mereces mais que isso, que ainda é pouco para o que verdadeiramente merecia, e se estou sendo bom para contigo, é porque sou grato pelo reconhecimento e compaixão de Laion — impusera justamente o senhor rei de Ayres. Sim, com justiça, pois o pecado da donzela é imperdoável, mal havia nascido... Aquela pobre e indefesa criança!
— Diga-me, pois és meu pai, cure-me desta doença, deste pecado, pelo amor a todos os seus, ampare-me — sussurrou mais docemente e aflita.
— Desculpe, princesa — disse ternamente o rei —; contudo, não poderia fazer nada por ti. Nasceste marcada por esta Prisão, que é a melhor e menos dolorosa forma de pagares pelo pecado que cometera.
— Como, papai, como não podeis fazer nada, se és o rei de Ayres? — sussurrara com eminência.
— Peça-me outra coisa que realizarei, filha — replicara o rei.
A Prisioneira apenas sentou-se sobre o piso reluzente do presídio, abaixou a cabeça, protegendo as suas lágrimas com os punhos... Pois te amo, papai!
Laion, todavia, reservava sentimentos ainda mais ternos pela Princesa.
— Rei de Ayres, peço, rogo-lhe... — enunciara o Senhor de Ayres, Laion.
— Não posso ajudá-la, os Magos Sombrios estão ao nosso redor, guardando a prisão de Ayres — retrucara Ezequiel, o rei .
— Mas com as minhas habilidades posso despistá-los — Laion arriscou.
A excelência baixou a cabeça, ruminando, dizendo:
— Peço visita à minha esposa!
E o pedido fora-lhe atendido.
— Aqui estou, minha senhora... — sussurrara o rei.
— Nesta prisão, neste cubículo avisto a minha pobre filhinha, que fora aprisionada por atos que cometera? — indagara Sara, a antiga rainha de Ayres.
Sara estava também aprisionada numa cela idêntica à da donzela, princesa de Ayres. Todavia, da sua prisão poderia avistar a filha através de uma parede mágica.
— Às vezes parece que pode me ver — articulou observando a filha e tocando a parede com ternura. E a outra também observava e tocava à parede, como se pudesse adivinhar que do outro lado jazia a querida mãe, que também se fez prisioneira. A rainha igualmente se expressava aos sussurros, tal como a princesa.
— É o devido momento de buscar o tal mundo dos mortais. Ali poderão se esconder dos Magos Sombrios — afirmara Ezequiel tocando as mãos da amada.
— Mas e você, senhor, como ficarás? — questionara aos murmúrios com preocupação.
— Não te preocupes, minha rainha, pois ficarei bem... Não se preocupe.
Logo entrara Laion com os seus olhos integralmente ebúrneos e enigmáticos. Disse:
— Está mais que na hora, rainha. Levar-te-ei a ti e a tua filha até a terra dos mortais.
Sara fitou atentamente a face da filha, ainda espiava à parede, como se fosse íntima dela. Respirou profundamente, tirou os olhos da imagem errônea, observou intrínseco, e enunciara suavemente:
— Sonhava sempre em poder pegá-la ao colo, em pô-la para dormir, em sussurrar em seus ouvidos histórias de amor... — respirou profundamente. — Mas não posso! Veja como é bela... Não me perdoará pelo o que fiz... Meu Deus, não posso!
Fora uma das cenas mais turbulentas, o regresso à filha...
Entretanto seguiu-se a conversação de belas ondas sonoras triviais ao reino, porém que enunciava o fim daquele sofrimento que seria eterno?
— Não pensas nisso... Amem-se, esposa minha — findou Ezequiel.
O pai entrara primeiro. Logo penetrara Laion. Ambos com um sorriso oculto nos lábios. Estavam ao mesmo preocupados e empolgados para desvendar a reação que a princesa teria.
— Cara princesa de Ayres, minha filha — disse o rei sorrindo e abraçando a donzela.
A menina chorava sem dizer uma palavra. Estava assustada e inconformada com o seu destino.
— Não, não chore — prosseguiu o pai da princesa. — E se visse a tua mãe, e a abraçasse, e a beijasse, tu a louvarias?
— Consinto que sim, louvá-la-ia; porém não me iluda com devaneios — segredara a Prisioneira com uma voz borbulhante pelas lágrimas.
E a mulher penetrara na alcova. A Prisioneira de Ayres avistara pela primeira vez a imagem da mãe. Percebeu-se logo que se tratava da ama e correu a abraçar-lhe. Ambas lamuriavam de alegria. A cena perdurou por poucos minutos, até que se detiveram às lágrimas e se retiraram da alcova que fora desde o nascimento da Princesa o seu lar, que lhe seria ainda supremo.
Quando Laion abrira o portal para o universo dos mortais, apareceram-lhes os Magos Sombrios, eram seres que pairavam sobre o ar sensacionalmente através de forças prestidigitadoras. A Prisioneira sussurrou docemente:
— Será que a minha sina perdurará dentro da prisão de Ayres? Não posso viver... Deus, valha-me!
Entretanto de nada adiantaria tais palavras. A princesa não conseguiu o que almejava. Laion foi desencantado e o pai teve de aceitar que a filha fosse um mal em si mesmo, a pior das prisioneiras de todas as eras.
A maior pecadora, a Prisioneira de Ayres, se via outra vez cerrada para toda a eternidade na alcova de suas conspirações.
A Prisioneira era tão bela que poderia seduzir qualquer homem da esfera terrestre. Era a própria Afrodite, mas ainda mais graciosa e majestosa.
— Senhor de Ayres, lhe agradeço pela preocupação, mas é mister sentir remorso... Sabe, meu senhor, eu sinto que estou casta, tal como nunca estive — dissera a Prisioneira sussurrando com uma voz suave e melodiosa (sempre sussurrava docemente, era calma e austera ao expressar-se).
O Senhor pôs-se mais a frente vagarosamente e articulara:
— Sim, minha senhora, sinto que estás casta. Porém que habitares Ayres como prisioneira pelo pecado que te carregas desde o nascimento. Prometa-me que não mais perturbarás o sonho de outro mortal — este tem a voz grave e bela, como a voz de um vigoroso homem.
— Não alcanço o privilégio interior. Sei que preciso esquecer do mundo exterior; todavia se torna algo impossível quando eu vou me tornando mulher. Percebes-te, Laion?
— Sei de todas as coisas que cogitas, Princesa de Ayres; entretanto deves tentar ocultar esses desejos... — pausa — senão algo do pior acontecerá.
—... Mas o meu amor está a minha espera — lágrimas. — Não posso continuar prisioneira. Este cubículo, sei, foi a melhor coisa que encontraste. Aqui estou presa desde o meu surgimento; pois completo hoje meus quinze anos, Laion, senhor.
— Desculpe-me, princesa — cerrou os olhos, comovido —, não mais posso ajudar-te.
Retirou-se pausadamente da alcova, que era um quarto claro e brilhante como a estrela da noite, era inteiramente compacto, e eternamente cerrado.
A Prisioneira acomodou-se sobre o chão e pôs-se a chorar. O seu pranto perdurou algumas horas.
— Por que choras, princesa? — questionara uma voz que surgira abruptamente na alcova.
— Não mais posso vê-lo... Esqueça-me! — segredara a Prisioneira.
A imagem do cavalheiro se fez. E ela abraçava a senhorita com ternura, sussurrando-lhe aos ouvidos coisas amáveis e esplêndidas. Entoara uma canção de rimas e ecos rígidos, que seguiam. E a princesa secou as lágrimas, abraçando o cavalheiro. Ali estavam em meio a uma floresta apaixonante, dedicando reciprocamente a afabilidade de seus corpos ardentes.
Entretanto, logo o jovem despertara de suas quimeras e sentira a ausência do calor do corpo da senhorita.
Na sua prisão chegara o rei de Ayres, seu pai. Uma cólera o tomava:
— Serás castigada, princesa! Como ousas enfrentar as minhas imposições? Ficarás aqui para toda a eternidade e não mais verás ninguém, e as suas visões e poderes serão aniquilados. E tu sabes que mereces mais que isso, que ainda é pouco para o que verdadeiramente merecia, e se estou sendo bom para contigo, é porque sou grato pelo reconhecimento e compaixão de Laion — impusera justamente o senhor rei de Ayres. Sim, com justiça, pois o pecado da donzela é imperdoável, mal havia nascido... Aquela pobre e indefesa criança!
— Diga-me, pois és meu pai, cure-me desta doença, deste pecado, pelo amor a todos os seus, ampare-me — sussurrou mais docemente e aflita.
— Desculpe, princesa — disse ternamente o rei —; contudo, não poderia fazer nada por ti. Nasceste marcada por esta Prisão, que é a melhor e menos dolorosa forma de pagares pelo pecado que cometera.
— Como, papai, como não podeis fazer nada, se és o rei de Ayres? — sussurrara com eminência.
— Peça-me outra coisa que realizarei, filha — replicara o rei.
A Prisioneira apenas sentou-se sobre o piso reluzente do presídio, abaixou a cabeça, protegendo as suas lágrimas com os punhos... Pois te amo, papai!
Laion, todavia, reservava sentimentos ainda mais ternos pela Princesa.
— Rei de Ayres, peço, rogo-lhe... — enunciara o Senhor de Ayres, Laion.
— Não posso ajudá-la, os Magos Sombrios estão ao nosso redor, guardando a prisão de Ayres — retrucara Ezequiel, o rei .
— Mas com as minhas habilidades posso despistá-los — Laion arriscou.
A excelência baixou a cabeça, ruminando, dizendo:
— Peço visita à minha esposa!
E o pedido fora-lhe atendido.
— Aqui estou, minha senhora... — sussurrara o rei.
— Nesta prisão, neste cubículo avisto a minha pobre filhinha, que fora aprisionada por atos que cometera? — indagara Sara, a antiga rainha de Ayres.
Sara estava também aprisionada numa cela idêntica à da donzela, princesa de Ayres. Todavia, da sua prisão poderia avistar a filha através de uma parede mágica.
— Às vezes parece que pode me ver — articulou observando a filha e tocando a parede com ternura. E a outra também observava e tocava à parede, como se pudesse adivinhar que do outro lado jazia a querida mãe, que também se fez prisioneira. A rainha igualmente se expressava aos sussurros, tal como a princesa.
— É o devido momento de buscar o tal mundo dos mortais. Ali poderão se esconder dos Magos Sombrios — afirmara Ezequiel tocando as mãos da amada.
— Mas e você, senhor, como ficarás? — questionara aos murmúrios com preocupação.
— Não te preocupes, minha rainha, pois ficarei bem... Não se preocupe.
Logo entrara Laion com os seus olhos integralmente ebúrneos e enigmáticos. Disse:
— Está mais que na hora, rainha. Levar-te-ei a ti e a tua filha até a terra dos mortais.
Sara fitou atentamente a face da filha, ainda espiava à parede, como se fosse íntima dela. Respirou profundamente, tirou os olhos da imagem errônea, observou intrínseco, e enunciara suavemente:
— Sonhava sempre em poder pegá-la ao colo, em pô-la para dormir, em sussurrar em seus ouvidos histórias de amor... — respirou profundamente. — Mas não posso! Veja como é bela... Não me perdoará pelo o que fiz... Meu Deus, não posso!
Fora uma das cenas mais turbulentas, o regresso à filha...
Entretanto seguiu-se a conversação de belas ondas sonoras triviais ao reino, porém que enunciava o fim daquele sofrimento que seria eterno?
— Não pensas nisso... Amem-se, esposa minha — findou Ezequiel.
O pai entrara primeiro. Logo penetrara Laion. Ambos com um sorriso oculto nos lábios. Estavam ao mesmo preocupados e empolgados para desvendar a reação que a princesa teria.
— Cara princesa de Ayres, minha filha — disse o rei sorrindo e abraçando a donzela.
A menina chorava sem dizer uma palavra. Estava assustada e inconformada com o seu destino.
— Não, não chore — prosseguiu o pai da princesa. — E se visse a tua mãe, e a abraçasse, e a beijasse, tu a louvarias?
— Consinto que sim, louvá-la-ia; porém não me iluda com devaneios — segredara a Prisioneira com uma voz borbulhante pelas lágrimas.
E a mulher penetrara na alcova. A Prisioneira de Ayres avistara pela primeira vez a imagem da mãe. Percebeu-se logo que se tratava da ama e correu a abraçar-lhe. Ambas lamuriavam de alegria. A cena perdurou por poucos minutos, até que se detiveram às lágrimas e se retiraram da alcova que fora desde o nascimento da Princesa o seu lar, que lhe seria ainda supremo.
Quando Laion abrira o portal para o universo dos mortais, apareceram-lhes os Magos Sombrios, eram seres que pairavam sobre o ar sensacionalmente através de forças prestidigitadoras. A Prisioneira sussurrou docemente:
— Será que a minha sina perdurará dentro da prisão de Ayres? Não posso viver... Deus, valha-me!
Entretanto de nada adiantaria tais palavras. A princesa não conseguiu o que almejava. Laion foi desencantado e o pai teve de aceitar que a filha fosse um mal em si mesmo, a pior das prisioneiras de todas as eras.
A maior pecadora, a Prisioneira de Ayres, se via outra vez cerrada para toda a eternidade na alcova de suas conspirações.
Ronyvaldo Barros dos Santos
Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons. Você pode copiar, distribuir, exibir, executar, fazer uso comercial da obra, desde que seja dado crédito ao autor original (RONYVALDO BARROS DOS SANTOS (http://ronyvaldo.wordpress.com/rbs)). Você não pode criar obras derivadas. |
Comentários
Postar um comentário